A aposta nas pessoas para além dos processos, sistemas e normas.

Esse artigo pretende apresentar em breves linhas um olhar psicanalítico para os desafios humanos que as empresas tendem a enfrentar quando decidem implantar programas de compliance.

Implantar programas que ajudem a gerenciar os riscos empresarias, sejam eles econômicos, sociais ou ambientais, já deixou de ser considerada uma opção ou um diferencial para se tornar algo esperado das empresas, uma obrigação mesmo.

Ferramentas disponíveis para instalar programas e até cultura de governança e compliance surgem todos os dias e trazem consigo promessas de resolução de problemas como fraudes, desvios deletérios de conduta, práticas ambientais, fiscais, financeiras e negociais.

A solução, no entanto, não é redutível à implantação bem-sucedida de campanhas internas, treinamentos, políticas e normas que atendam as exigências do ambiente regulatório e protejam o negócio e a marca de danos econômicos e reputacionais. Por quê? Observamos diariamente casos de vazamentos de dados, invasão de sistemas e comportamentos antiéticos, para dizer o mínimo, dentro de entidades públicas e privadas que supomos altamente preparas para evitar tais atos.

A complexidade envolvida em ataques e tramas para burlar, fraudar e desviar sustentadas ou até viabilizadas pelo uso de tecnologia parece sempre estar um passo à frente de qualquer sistema de vanguarda pensado para evitar esses crimes. O que tal constatação nos ajuda no momento de implantar um programa de compliance já que de saída o gerenciamento de risco parece ele mesmo estar um permanente risco?

Nosso entendimento é que para além de um programa bem desenhado em termos de processos, políticas e sistemas que instrumentalizem e capacitem tecnicamente as pessoas para adotarem novas práticas e comportamentos, é preciso investir em uma cultura de governança e compliance baseada na confiança nas pessoas e entre as pessoas, em larga escala. Por quê? Se admitimos que nenhum sistema é infalível contra erros e vulnerabilidades, é somente transformando cada colaborador ele mesmo num guardião da reputação e do negócio. Se as pessoas estiverem convencidas por elas mesmas da importância da conduta ética como condição de estabilidade do ser e fazer organizacionais, elas estarão dispostas a dar um passo à frente e apontar os riscos antes e até melhor que qualquer sistema, processo ou norma. Mas para darem esse passo à frente elas precisarão confiar no ambiente interno, sentir que a cultura da empresa valoriza essa atitude e, o mais importante, que as lideranças são a principal de fonte de exemplo desse comportamento.

Como criar uma cultura ética sustentada pelo exemplo das lideranças de todas as camadas seria tema para um próximo artigo sobre gerenciamento de riscos.

Hamilton Frediani de Faria Correa
Sócio-fundador da Clínica Corporativa – Confiar e Cooperar para (Auto)transformar
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